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Agenda regulatória e segurança alimentar e nutricional

por Michelle Matos publicado 05/04/2018 13h29, última modificação 05/04/2018 17h14

A agenda regulatória de alimentos será a pauta da reunião plenária do Consea do próximo dia 11 de abril.

  • O que caracteriza a agenda regulatória? 
  • Qual a sua relação com a segurança alimentar e nutricional?  

 
As principais doenças e causas de morte no Brasil e no mundo estão relacionadas a fatores ambientais como a qualidade da alimentação. O que comemos atualmente é resultado de uma série de determinantes sociais, econômicos e políticos que, em grande medida, não tem a saúde e qualidade de vida como objetivo central. É possível traçar um fio que passa pelos modelos de produção intensiva de alimentos que geram degradação ambiental, relações sociais e de trabalho precarizadas, concentração no sistema de abastecimento, levam à homogeneização dos hábitos e perda da cultura alimentar e chegam à atual epidemia de doenças crônicas não transmissíveis. Esses aspectos têm levado ao que chamamos de ambientes alimentares que não favorecem escolhas e consumo de alimentos saudáveis. Várias evidências mostram que medidas de auto-regulação para publicidade, composição de produtos, restrição de comercialização de alimentos não saudáveis em ambientes públicos, como escolas, não têm o efeito na intensidade e velocidade necessárias para controlar os problemas de saúde atuais e futuros. 

Diante da necessidade de ações efetivas e urgentes, os organismos internacionais como a  Organização Pan-Americana da Saúde (Opas)  e a Organização Mundial da Saúde têm orientado  os países a adotarem medidas regulatórias como a restrição de publicidade e o aumento nos impostos de refrigerantes e outras bebidas industrializadas, como forma de reduzir o consumo de produtos não saudáveis. Esse conjunto de medidas de responsabilidade do poder público é denominado como "agenda regulatória".  

Esta agenda apresenta desafios e vulnerabilidades, pela ação de setores que têm interesses e benefícios econômicos e comerciais, como as indústrias de produtos alimentícios, que incidem para atrasar e restringir o processo regulatório. Um exemplo disso diz respeito à questão tributária dos produtos ultraprocessados. O modelo vigente favorece empresas do setor como a de refrigerantes, gerando perdas volumosas na arrecadação, estimadas em R$ 3,9 bilhões/ano, através de mecanismos de isenção fiscal e outros R$ 3,3 bilhões/ano em recebimento de créditos. 

Essa distorção gera um prejuízo adicional se considerarmos que 14% da população brasileira consome refrigerantes cinco ou mais vezes na semana, e que o setor produz 14,9 bilhões de litros/ano. Esse consumo contribui para o surgimento da obesidade, gerando gastos em saúde tanto para as famílias quanto para o sistema de saúde. 

Para o Consea, alimentação adequada e saudável é "alimentação adequada e saudável é a realização de um direito humano básico, com a garantia ao acesso permanente e regular, de forma socialmente justa, a uma prática alimentar adequada aos aspectos biológicos e sociais dos indivíduos, de acordo com o curso da vida e as necessidades alimentares especiais, pautada no referencial tradicional local. Deve atender aos princípios da variedade, equilíbrio, moderação, prazer, sabor, dimensões de gênero e etnia, e a formas de produção ambiental, social e economicamente sustentáveis, livres de contaminantes físicos, químicos, biológicos e de organismos geneticamente modificados". Este conceito tem orientado nossas propostas para formulação de políticas públicas de SAN e também publicações como o Guia Alimentar para a População Brasileira. Por isso, pela estreita relação com o tema da regulação, destacamos o dever do Estado em tomar todas as medidas possíveis para promover ações públicas que permitam o exercício efetivo deste direito e evitar que terceiros, empresas ou indivíduos, privem as pessoas de seu direito à alimentação adequada.

Atualmente temos uma janela de oportunidade pois a Anvisa está revisando o regulamento sobre a rotulagem nutricional de alimentos. Em 2015 o Consea enviou uma recomendação à Anvisa para atualizar as normas de rotulagem, em resposta foi instalado um grupo de trabalho que analisou a situação de uso e compreensão do modelo atualmente adotado no Brasil, além de propostas adotadas em diferentes países. Organizações da sociedade civil têm defendido um modelo de rotulagem com advertências na parte frontal da embalagem, inspirada no que foi adotado no Chile. É necessário que a Anvisa apresente os resultados deste grupo de trabalho e siga as etapas para uma nova regulamentação, colocando uma proposta em consulta pública. Esta plenária tem o objetivo de contribuir com o processo de mobilização social por uma rotulagem nutricional simples, objetiva, de fácil compreensão e que contribua de maneira eficaz com escolhas alimentares saudáveis.  

Quer saber mais ?

Rotulagem

* Para entender mais sobre o processo de revisão da rotulagem nutricional que está acontecendo na Anvisa assista o mini documentário sobre a rotulagem nutricional frontal na América Latina produzido pelo canal “Do campo à mesa”. 

Avanços na agenda regulatória na América Latina 

* Para entender mais sobre a indústria da comida, leia a matéria “A América Latina virou o terror da indústria de comida ‘porcaria”, produzida pelo site “O Joio e o Trigo”

* Para entender mais sobre as táticas apresentadas pelas gigantes multinacionais de alimentos, refrigerantes e álcool e sobre a Influência da indústria nos processos políticos e regulatórios, leia a publicação “Me engane de novo”.

Tributação

* Para entender sobre Tributação e Zona Franca de Manaus e os bilhões que damos todos os anos à indústria de refrigerantes, leia o texto Toma essa: os bilhões que damos todos os anos à indústria de refrigerantes produzido pelo site “O Joio e o Trigo”.

* Para entender a importância de se taxar as bebidas açucaradas, leia o texto produzido pela Aliança por uma Alimentação Saudável “Por que taxar bebidas açucaradas”.

* Para compreender as inverdades das afirmações produzidas pela indústria como “Impostos sobre bebidas açucaradas não resolvem os problemas de obesidade e diabetes”, “Impostos sobre bebidas açucaradas não diminuem o consumo desse tipo de bebida” ou “Existem apenas evidências pouco convincentes de que o imposto diminui o consumo”, entre outras leia o documento “Preços e impostos sobre as bebidas açucaradas: Respostas às afirmações da indústria”, produzido pela Aliança por uma Alimentação Saudável.

Publicidade de alimentos 

* Para conhecer um parecer em defesa da constitucionalidade da restrição da publicidade de alimentos voltada ao público infantil, veja o vídeo do professor titular de Direito Constitucional da USP, Virgílio Afonso da Silva.

* O vídeo “Muito Além do Peso” apresenta a realidade das crianças brasileiras  acima do peso. O documentário estuda o caso da obesidade infantil principalmente no território nacional, mas também nos outros países, entrevistando pais, representantes das escolas, membros do governo e responsáveis pela publicidade de alimentos. 

Posicionamento OPAS/OMS sobre tributação

* Para entender por que aumentar preço de bebidas adoçadas é uma das melhores estratégias para melhorar a alimentação dos brasileiros, leia a matéria produzida pela Organização Pan-Americana de Saúde: Aumentar preço de bebidas adoçadas é uma das melhores estratégias para melhorar alimentação dos brasileiros

Correlação entre o consumo de utraprocessados e câncer

* Para entender mais sobre como o consumo de alimentos ultraprocessados pode aumentar o risco de câncer, leia o texto “Consumption of ultra-processed foods and cancer risk: results from NutriNet-Santé prospective cohort”.

* Para entender a relação entre consumo de ultraprocessados e câncer, leia a matéria produzida pela BBC “Aumento no consumo de ultraprocessados pode elevar incidência de câncer”.