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Na agenda e na pauta do país
Desejamos políticas de abastecimento alimentar que promovam formas socialmente eqüitativas e ambientalmente sustentáveis de produção e comercialização de alimentos.
Celebrado anualmente em 16 de outubro, neste ano o Dia Mundial da Alimentação chega num momento em que duas crises sistêmicas assombram o mundo - a do sistema financeiro internacional e a do sistema alimentar global, que é o tema deste artigo.
São múltiplos os fatores da crise alimentar: expansão econômica de países emergentes; crescimento da demanda; aumento do poder de compra dos mais pobres; uso de alimentos como o milho para produção de etanol; alta do petróleo; quebras de safras e baixos níveis de estoques, entre outras causas.
A crise não é um mero descompasso entre demanda e oferta, mas uma crise de modelo, um modelo que supõe uma liberalização plena nunca efetivada mas que desmontou os instrumentos de regulação pública em muitos países e gerou padrões iníquos de produção, distribuição e consumo de alimentos.
Os países, entre eles o Brasil, abriram mão desses instrumentos de regulação. O resultado é que hoje muitos governos, sobretudo os do Hemisfério Sul, se vêem despreparados para enfrentar situações como essas - a explosão da crise na economia mundial é um fato revelador da necessidade de regulação de mercados.
A segurança alimentar e nutricional requer não apenas a recuperação da capacidade reguladora do Estado, mas também a ampliação do acesso à terra e à água, o fomento à agricultura familiar de base agroecológica e ações estruturantes e emacipatórias que favoreçam o acesso a uma alimentação saudável e alimentos limpos.
Desejamos políticas de abastecimento alimentar que promovam formas socialmente eqüitativas e ambientalmente sustentáveis de produção e comercialização de alimentos, valorizem e dêem prioridade à agricultura familiar e aos pequenos empreendimentos rurais e urbanos.
Defendemos a eliminação das formas abusivas de intermediação, a maior aproximação entre a produção e o consumo de alimentos com o incentivo dos circuitos locais e regionais de abastecimento, o estímulo à oferta de produtos diversificados da agricultura familiar, o acesso dos pequenos agricultores aos mercados e a redução do desperdício de alimentos.
Precisamos fortalecer e qualificar o pequeno varejo de alimentos, estimular redes e fundos solidários, associações e cooperativas de pequenos produtores e assentados, bem como envolver quilombolas, agroextrativistas, pescadores e indígenas.
Assim, escapamos da armadilha de fazer "mais do mesmo" e avançamos na construção de um Brasil melhor, com justiça social, com soberania alimentar e nutricional, um país que respeita e promove o direito humano à alimentação adequada e saudável, direito essencial à vida e à dignidade de homens e mulheres.
Que o Dia Mundial da Alimentação - esse chamamento à reflexão - coloque essas questões na agenda de prioridades dos governos (nos diversos níveis de poder), no centro das atenções e exigências da sociedade e na pauta diária de cobertura dos meios de comunicação social.
Renato S. Maluf é economista, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e, presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.