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“Exigimos reparação em todas as políticas públicas”

publicado: 26/02/2018 15h36, última modificação: 26/02/2018 15h36
Segundo Maria Noelci, as discussões do Encontro 5ª+2 têm de ser rumo à garantia ao acesso das mulheres aos programas de segurança alimentar e nutricional. Imagem: Consea

Segundo Maria Noelci, as discussões do Encontro 5ª+2 têm de ser rumo à garantia ao acesso das mulheres aos programas de segurança alimentar e nutricional. Imagem: Consea

“A fragilidade socioeconômica da população negra, em especial das mulheres negras, é resultado da desigualdade racial”. A afirmação é de Maria Noelci, do Movimento de Mulheres Negras para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

“O número de mulheres negras em posição de destaque em organizações públicas é desproporcional à sua importância”, diz ela, destacando a necessidade da implementação de políticas públicas de reparação dessa realidade.

Ex-conselheira do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Noelci tem atuação destacada no enfrentamento à violência contra mulheres e pela igualdade de gênero.

De 6 a 8 de março, ela participará, em Brasília, do Encontro Nacional 5ª+2, que fará um balanço das propostas apresentadas na 5ª Conferência Nacional Segurança Alimentar e Nutricional, realizada na capital federal em novembro de 2015.

“Nossa discussão tem que ser rumo à garantia ao acesso das mulheres aos programas de segurança alimentar e nutricional”, avalia Noelci em relação às expectativas das discussões da 5ª+2. Confira abaixo a entrevista que ela concedeu ao site do Consea.

Como é atuação do Movimento de Mulheres Negras para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional?

Nosso trabalho é centrado na articulação com organizações da sociedade civil para propor políticas públicas que garantam o direito humano à alimentação adequada da população negra, em particular das mulheres negras. Avaliamos e monitoramos os efeitos das políticas públicas, buscando incentivar o intercâmbio entre as entidades e insistindo fortemente na busca por mudanças.

Quantas pessoas participam do movimento?

Estamos em todas as regiões do Brasil. Atualmente, somos 42 integrantes, com maior incidência nas regiões Sul e Centro-Oeste. Atuamos também com três integrantes no exterior, em Guiné Bissau, no Fórum de Mulheres Rurais, nos Estados Unidos e na África do Sul.

Quais as dificuldades que a mulher negra enfrenta para a garantia dos seus direitos?

Na verdade, faltam oportunidades para a população negra em geral. Mas nós, mulheres negras, sofremos principalmente com a inexistência de visibilidade e exclusão das discussões e ações concretas sobre gênero e raça. A violência é outra questão. Ela ameaça a nossa atuação em qualquer segmento. O fortalecimento da autonomia econômica e produtiva está em assegurar a realização de direitos, mas eles são ameaçados com essa violência. Discriminação e racismo são fortes obstáculos. Isso retira nossa autonomia.

Um dos temas defendidos pela senhora é a igualdade de gênero no campo e na cidade. Como ela pode ser alcançada?

As políticas de igualdade de gênero devem estar no campo, na cidade, na floresta e nas águas. Devemos assumir a igualdade de gênero e insistir que o fator racial e a identidade de gênero sejam incluídos nos dados para formulação das políticas públicas.

Quais outras políticas públicas deveriam ser implantadas em defesa das mulheres negras e também para a igualdade de gênero?

Exigimos reparação em todas as políticas públicas. Os indicadores constatam que a desigualdade racial e de gênero aparecem como um forte fator de geração de desigualdade, contribuindo para a fragilidade da situação socioeconômica da população negra em geral e das mulheres negras em especial. É importante a implementação de políticas onde possamos identificar objetivos e estratégias. Nossa importância como agentes políticos é pouco valorizada e reconhecida. O número de mulheres negras em posição de destaque em organizações públicas ainda é desproporcional à sua importância.

Qual o impacto da discriminação racial para o acesso dos negros aos seus direitos?

O racismo nos adoece e encurta nossa existência. Não inventamos o racismo, somos as atingidas e atingidos. A sociedade é racista. Isso nos cobra um enfrentamento. Quem inventou o racismo, que dê conta. É necessário mudar esta realidade. Isso é responsabilidade de todos.

Qual a sua expectativa para o Encontro 5ª+2?

Espero grandes debates sobre a atual conjuntura política, em defesa das conquistas alcançadas. Desejo também descobrir mecanismos para garantir que a execução das políticas públicas esteja livre de racismo, para que as estatísticas contemplem todos os segmentos da população negra. Nossa discussão tem que ser rumo à garantia ao acesso das mulheres aos programas de segurança alimentar e nutricional.

Entrevista: Nathan Victor (estagiário), com supervisão de Francicarlos Diniz (jornalista)

Fonte: Ascom/Consea