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Dica de leitura: Geografia da Fome: sete décadas do livro clássico de Josué de Castro
Josué de Castro - 10.ª Edição Revista - Editora Antares
Em 1946, aos 38 anos de idade, Josué de Castro lançava aquele que viria a ser seu livro de referência, um clássico. Estamos falando de “Geografia da Fome – o dilema brasileiro: pão ou aço”.A obra foi resultado de anos de estudos, pesquisas e experiências do autor, em contato direto com as massas assoladas pelo flagelo da fome.
Esta palavra - fome - era então um tema proibido, tratada como fenômeno natural. Josué pegou a estrada, correu trechos, conheceu o Brasil. “O assunto deste livro é bastante delicado e perigoso”, advertia o autor, já no prefácio. “A tal ponto delicado e perigoso que se constituiu num dos tabus de nossa civilização”.
Segundo ele, era “realmente estranho, chocante, o fato de que, num mundo como o nosso, caracterizado por tão excessiva capacidade de escrever-se e de publicar-se, haja até hoje tão pouca coisa escrita acerca do fenômeno da fome, em suas diferentes manifestações”.
Josué se perguntava quais eram os fatores ocultos desta “verdadeira conspiração de silêncio” em torno da fome. Seria por simples obra do acaso que o tema não atraía o interesse dos espíritos criadores daqueles tempos? “Não cremos”, ele respondeu. “Longe de traduzir obra do acaso, [o fenômeno] parece condicionado às mesmas leis gerais que regulam as outras manifestações sociais”, destacou.
Silêncio premeditado
De acordo com ele, tratava-se de um “silêncio premeditado pela própria alma da cultura”. E explicou: “Foram os interesses e os preconceitos de ordem moral e de ordem política e econômica de nossa chamada civilização ocidental que tornaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável de ser abordado publicamente”.
Na época, causaram espanto, mas também propiciaram reflexões, no Brasil e no mundo, frases célebres como esta: “Enquanto metade da humanidade não come, a outra metade não dorme, com medo da que não come”.
Na sua obra clássica, ele desenhou o mapa da fome no Brasil, dividindo-o em cinco partes, de acordo com o contexto alimentar de cada uma: Amazônia, Nordeste açucareiro (apenas Zona da Mata e litoral), Sertão Nordestino, Centro-Oeste (aqui ele incluiu Minas Gerais) e o Sul.
Josué destinou um capítulo a cada uma região e abordou o processo de colonização das áreas, de produção de alimentos e de aparecimento de doenças nos moradores, entre outros aspectos.
O livro, que teve prefácio de Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde), foi oferecido a Euclides da Cunha, Rachel de Queiroz e José Américo de Almeida, que ele chamou de “os romancistas da fome no Brasil”.
Vida e obra
Josué Apolônio de Castro nasceu em 5 de setembro de 1908, no Recife, capital de Pernambuco, e faleceu em 24 de setembro de 1973, no exílio, em Paris (o país vivia sob o regime militar). Foi médico, nutrólogo, geógrafo, sociólogo, político, intelectual e, sobretudo, um humanista brasileiro, indicado três vezes ao Prêmio Nobel da Paz.
Ele foi embaixador do Brasil na Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), no qual presidiu o conselho executivo. Ganhou diversos prêmios literários, de sociologia e direitos humanos, por suas ideias progressistas e libertárias. No conjunto da obra, possui dezenas de livros publicados e traduzidos para 25 idiomas, entre eles “O Livro Negro da Fome”, “Sete Palmos de Terra e um Caixão” e “Homens e Caranguejos”.
Seus estudos e pesquisas criaram as bases para a instituição do salário mínimo e do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Pelas ideias que defendeu, em caráter pioneiro, pelo legado que dedicou às gerações seguintes e pelo exemplo de vida que deixou, Josué de Castro é o patrono do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
Fonte: Ascom/Consea